Wittgenstein, o filósofo que matou a filosofia.
A vida do filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein foi tão intensa quanto sua filosofia. Filho de Karl Wittgenstein, na época um dos industriais mais poderosos da Europa, renegou sua herança milionária, pois tanto dinheiro poderia atrapalhar seus pensamentos. Era exageradamente honesto, ingênuo, agressivo e apaixonado pela filosofia, tanto que qualquer um que não a valorizasse era solenemente desprezado como alguém de espírito inferior.
Alistou-se como oficial na primeira guerra mundial e participou de várias batalhas, ganhando várias condecorações por bravura. Recusou o chamado de recuar e abandonar seus soldados e foi feito prisioneiro. Em sua mochila de soldado estava o rascunho de uma das mais importantes obras da filosofia analítica: o Tractatus Lógico Philosophicus. Sobreviveu à guerra e trabalhou com professor de escola primária, jardineiro e mestre de obras, apesar de já ser reconhecido como um dos maiores filósofos do século XX. Sua irmã Margaret, com a intenção de dar um emprego ao seu “irmão maluco”, e conhecendo suas assombrosas habilidades em lógica e matemática, o contratou para construir uma casa. Wittgenstein se dedicou obsessivamente (como de costume) à construção e criou uma casa com estilo modernista anti decorativo que se tornou uma referência da arquitetura moderna.
Com a ajuda de seu mestre, Bertrand Russell, tornou-se professor em Cambridge e travou debates com Alan Turing, um dos maiores matemáticos do século XX e um dos pais da computação. Durante a segunda guerra, se ofereceu para trabalhar como servente de hospital. Depois da guerra, se dedicou à conclusão do livro Investigações Filosóficas, que é também uma crítica ao seu primeiro livro, pois ninguém poderia superar Wittgenstein, a não ser ele mesmo. Posteriormente abandonou a vida acadêmica, pois achava que aquela não era a vida de um verdadeiro filósofo.
Enquanto que no Tractatus Lógico Philosophicus Wittgenstein busca a essência da linguagem, no Investigações Filosóficas ele se corrige e afirma que a linguagem varia seus significados e sentidos de acordo com os contextos, não possuindo essência mas apenas “jogos de linguagem”, o que tornaria impossível a busca pela verdade absoluta, pois o que existe são “jogos com regras” onde certo e errado são acordos coletivos regidos pela linguagem dentro de um contexto. Se quisermos saber o real significado de uma palavra, Wittgenstein sugere perguntar para quem a falou. Ele conclui então que a filosofia não seria mais possível após essa descoberta, uma vez que busca afirmações universais mas não consegue, ela mesma, transcender seu próprio jogo de linguagem. Os limites da minha linguagem são, portanto, os limites do meu mundo. Temos a pretensão da verdade, mas não percebemos que estamos presos em jogos de linguagem.
Wittgenstein foi um exemplo de verdadeiro filósofo, pois não relutou em corrigir suas próprias ideias, mostrando que a filosofia é uma busca constante que critica a si mesma e está sempre em movimento, assim como a vida e o pensamento. Diante da perplexidade filosófica que move todo filósofo, Wittgenstein percebeu as limitações da linguagem para expressar a transcendência do mundo e, diante disto, declarou: “sobre aquilo de que não se pode falar, deve-se calar”. Morreu de câncer aos 62 anos. Seu último recado para seus amigos foi: “Diga-lhes que tive uma vida feliz.”
Autor: Alfredo de Moraes Rêgo Carneiro
Graduando em Filosofia pela Universidade Católica de Brasília