A obra O Contrato Social, do filósofo suíço Jean-Jacques Rousseau, é uma das obras políticas mais influentes de todos os tempos. Seria razoável supor que Rousseau, ao chegar em Paris no ano de 1741 para tentar a vida como músico, tenha recebido um forte impacto daquela sociedade injusta e caótica.
Nessa época, o jovem músico não poderia imaginar que seria um dos maiores pensadores da humanidade. Tudo isso começou quando Rousseau, com apenas dezesseis anos, foi passear no campo e simplesmente decidiu fugir e vagar pelo mundo sozinho.
Teve a sorte de conseguir o apoio de Madame de Warens, uma baronesa que se tornou sua amante e cuidou de sua educação, conforme o próprio Rousseau narra na obra Devaneios de um caminhante solitário.
Graças ao cinema, podemos ter uma noção do impacto que Rousseau deve ter recebido ao chegar em Paris. Então, acredito que o filme O Perfume (2006) é perfeito para fazer esta experiência.
O filme conta a história de um jovem que nasceu em um mercado de peixe de Paris em 1738, portanto, apenas três anos antes da chegada de Rousseau na cidade.
O protagonista da história não teve a mesma sorte de Rousseau e viveu como escravo em um curtume, nunca tendo conhecido de fato suas ruas. Seu nome era Jean-Baptiste Grenouille, e possuia um talento incomum para distinguir aromas de forma quase sobrenatural.
Tanto no personagem fictício do filme quanto em Rousseau, existe a ideia de um caminhante solitário com talentos extraordinários. Para esses, o mundo causa perplexidade.
Se Jean-Baptiste Grenouille ficou perplexo com os aromas da cidade, Jean-Jacques Rousseau deve ter ficado perplexo com os contrastes sociais que também surgem na cena, afinal, é dele também a obra Discurso sobre as origens da desigualdade.
Rousseau e os contrastes de Paris
O extremo contraste social é muito bem representado na cena que ilustra este post. Para uma mente corriqueira, o ambiente de Paris poderia representar apenas as coisas como elas são. Mas para Rousseau, dotado de grande sensibilidade filosófica, a cidade representava nosso fracasso social e a corrupção da natureza humana.
Rousseau acreditava que o homem nasce naturalmente bom, mas a sociedade o corrompe. O surgimento do Estado na história da humanidade deveria representar um contrato social que os homens fazem em troca de segurança e defesa dos seus direitos, porém, acabou se tornando uma ferramenta de concentração de poder.
Rousseau será o grande crítico de Thomas Hobbes e John Locke. Esses dois filósofos contratualistas propõem, respectivamente, a monarquia e o parlamentarismo como solução para a organização social.
Entretanto, Rousseau acreditava que, enquanto o homem não participasse da criação das leis, ele nunca seria livre de fato.
Para ele, nas propostas de Hobbes e Locke as leis são feitas por uma elite que age sempre em favor próprio, perpetuando a injustiça.
Rousseau irá propor a democracia direta, onde o povo poderá participar da criação das leis. Suas ideias influenciaram a Revolução Francesa e podemos dizer que nossa democracia brasileira é fruto do pensamento desse filósofo.
Infelizmente ainda estamos muito longe de uma solução para a injustiça social, se é que existe alguma solução. A cena do filme O Perfume pode ser considerada uma cena habitual mesmo nos dias de hoje.
O avanço tecnológico apenas confirmou a tese de Rousseau de que quanto mais avançamos nos conhecimentos técnicos e científicos, mais imoral vai se tornando a humanidade.
Apesar disso, vale a pena fazer a experiência de se imaginar nas ruas de Paris na pele de um jovem extraordinário que olha perplexo para o mundo. Enquanto houver aqueles que se espantam com aquilo que ninguém mais percebe, estaremos sempre caminhando.
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Autor: Alfredo Carneiro
Editor do netmundi.org