Xenófanes de Cólofon: o surgimento da crítica teológica
Xenófanes (570 – 475 a.C) era natural de Cólofon, cidade da Jônia. Fugiu aos vinte e cinco anos quando a cidade foi invadida pelos Medos. Parte da sua vida foi dedicada a viajar pela Grécia ganhando a vida como poeta rapsodo.
Viveu mais de 90 anos e escreveu algumas obras importantes, entre elas um poema considerado filosófico, Sobre a Natureza, das quais restaram alguns fragmentos. Xenófanes é citado por Platão como possível fundador da Escola Eleática e mestre de Parmênides.
Se destacou entre os filósofos pré-socráticos pelo interesse nas questões teológicas e pela crítica à concepção antropomórfica dos deuses feita por Homero e Hesíodo, própria da religião grega tradicional, conforme o fragmento 11:
“Homero e Hesíodo atribuíram aos deuses tudo quanto entre os homens é vergonhoso e censurável, roubos, adultérios e mentiras recíprocas.”
Suas inúmeras viagens lhe deram oportunidade de constatar não só as diferenças entre os deuses de diversas regiões, mas também a tendência de atribuir aos deuses características físicas e comportamentos típicos da etnia e cultura da qual fazem parte, como atestam os fragmentos 14 e 15:
“Os mortais imaginam que os deuses foram gerados e que têm vestuário e fala e corpos iguais aos seus.”
“Os Etíopes dizem que os seus deuses são de nariz achatado e negros; os Trácios, que os seus têm olhos claros e o cabelo ruivo”.
Xenófanes teve o mérito de introduzir a crítica filosófica no âmbito das crenças religiosas com o objetivo de purificá-las das superstições e possibilitar uma elaboração conceitual mais profunda sobre os deuses.
O primeiro resultado de suas críticas foi a refutação da necessidade dos deuses terem atributos físicos e comportamentos imorais, os quais pertencem apenas aos homens.
Alguns historiadores atribuem a Xenófanes a elaboração de uma teologia monoteísta com base no fragmento 23, que afirma a existência de um deus único:
“Um só deus, o maior entre os deuses e os homens, em nada semelhante aos mortais, quer no corpo quer no pensamento.”
A concepção monoteísta de Xenófanes é questionável, pois o filósofo admite deuses inferiores em relação à divindade suprema. Em função da escassez de fragmentos, é difícil determinar a natureza desta divindade única.
Xenófanes chega a afirmar que Deus é o cosmo, portanto, teria uma perspectiva panteísta. Porém, alguns comentaristas afirmam que Xenófanes não é panteísta, pois no panteísmo Deus é dotado de movimento, e Xenófanes atribui a Deus imobilidade.
Xenófanes também abordou questões cosmológicas. Às vezes coloca a água como princípio e outras vezes a água e a terra. Mas pretendia explicar somente o nascimento dos seres terrestres, não o surgimento de todos os seres a partir de uma substância única, como fizeram os pensadores de Mileto.
O pensador de Cólofon também esboçou ideias sobre o comportamento ético, revelando a preocupação com o modo correto de viver que atravessou toda a história da filosofia.
Proclamou a superioridade dos valores espirituais, como a virtude, a inteligência e a sabedoria, sobre os valores puramente físicos, como a força e a velocidade apresentadas nas competições olímpicas.
A importância dos pré-socráticos
O termo pré-socrático carrega certo preconceito: é entendido como reflexão filosófica inicial que só irá amadurecer com Sócrates, Platão e Aristóteles. Também é pouco creditado aos pré-socráticos as bases que irão definir todo o pensamento ocidental depois deles.
Esse preconceito não condiz com a importância desses primeiros filósofos, que representam a aurora não apenas da Filosofia, mas da própria razão humana. Foram eles que criaram os conceitos universais que seriam utilizados posteriormente na ciência, bem como vários modelos utilizados pelos filósofos depois deles, inclusive Platão.
Alguns estudiosos desse período, como John Burnet, afirmam que os pré-socráticos representam uma sofisticada abstração que não deve ser interpretada como “filosofia inicial”, e só deveriam ser estudados depois de percorrida a longa estrada da filosofia.
- Sugestão de Leitura:
Dentre os pré-socráticos estão:
- Escola de Mileto
- Escola Jônica
- Escola Pitagórica
- Escola Eleática
- Escola Pluralista
Autor: Alfredo Carneiro – Graduado em Filosofia e pós-graduado em Filosofia e Existência pela Universidade Católica de Brasília.
Referência Bibliográfica
- DUMONT, J. P. Elementos de história da filosofia antiga. Brasília: EdUnB, 2005.
- HADOT, P. O que é a Filosofia antiga? São Paulo: Lisboa, 1999.
- SCHOFIELD, M. Os Filósofos pré-socráticos. Lisboa: Calouste, 1994