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Immanuel Kant – principais ideias

Na segunda metade do século XVIII, a Aritmética, a Geometria e a Física eram consensualmente aceitas como ciências, mas havia um forte ceticismo no que diz respeito à Metafísica, uns dos campos mais notórios da Filosofia.

Seria esta uma espécie de ciência mais geral, em contraposição às ciências particulares? Immanuel Kant (1724-1804) afirmava que não, repensando inteiramente a natureza do saber filosófico e mostrando os traços distintivos entre Filosofia e Ciência.

Para o filósofo prussiano, a Ciência é conhecimento do mundo e a Filosofia é conhecimento da Ciência. Em outras palavras: as ciências investigam os objetos (grosso modo, as coisas do mundo), enquanto a Filosofia é transcendental, no sentido de definir as condições que tornam possível o conhecimento das coisas do mundo (e o que me é impossível saber). Ciência e Filosofia respondem a tipos diferentes de perguntas, de modo que entre elas não existe qualquer concorrência.

Kant e a estrutura de conhecimento do sujeito


A Filosofia Transcendental de Kant tenta demonstrar que existe uma estrutura na forma de entender do sujeito (um tipo de filtro do conhecimento), que tornaria possível o saber científico.

Esse sujeito teria até o espaço e o tempo como formas a priori da sua sensibilidade (ou seja, espaço e tempo não existem “lá fora”, mas dentro da nossa mente). Ele teria também categorias a priori na sua faculdade de entender, como substância, causalidade, necessidade, etc. (isso mesmo: até mesmo a relação de causa e efeito não existiria de fato na “realidade”, mas apenas na “mente” ou entendimento do homem).

Segundo Kant, a Aritmética e a Geometria seriam possíveis em virtude desta estrutura interna do sujeito.

Na física, por exemplo, ao estabelecer relações de causa e efeito entre objetos da natureza, o sujeito empregaria elementos que estariam presentes a priori nesta faculdade de entender. Tudo isso Immanuel Kant argumentou exaustivamente de forma impecável na sua obra magna “A Crítica da Razão Pura”, demonstrando que não conhecemos de fato a “realidade” (a coisa-em-si), mas apenas aquilo que nosso entendimento filtra e apresenta para nós, os fenômenos.

Em suma: não lidamos diretamente com a realidade, mas com o que aparece para nós, os fenômenos.

Portanto, Aritmética, Geometria e Física seriam possíveis apenas em virtude dessas estruturas do entendimento presentes no sujeito. Ao receber estímulos sensoriais, o sujeito os organizaria segundo as formas do espaço e do tempo e os pensaria segundo as categorias.

Dessa maneira, o sujeito constituiria o mundo fenomênico, ou seja, o universo daquilo que aparece. Os objetos constituídos pelo sujeito seriam fenômenos ou representações desse mesmo sujeito.

No âmbito desse tipo de Filosofia, o que dizer da Metafísica, na medida em que ela fala sobre objetos além dos fenômenos como Deus e alma? Kant declara que tal tipo de discurso não seria conhecimento científico.

Ao dizer que Deus é a causa de todas as coisas, a Metafísica tradicional estaria empregando a relação de causa e efeito fora do seu âmbito legítimo de aplicação, pois categorias devem constituir  fenômenos, enquanto Deus não aparece, ou seja, não é fenomênico.

O que posso conhecer?


Nesses termos, a Filosofia Transcendental de Kant delimitou o conhecimento científico, tal como era entendido à época (Aritmética, Geometria e Física), fundamentando-o nas estruturas do sujeito. Portanto, tudo aquilo que tais estruturas não abrangessem estaria fora dos domínios do saber legítimo.

A coisa-em-si, independentemente do sujeito, seria inacessível ao conhecimento científico e também a qualquer tipo de conhecimento. O sujeito só conheceria as aparências que ele próprio pudesse constituir. Aquilo que existe (se existe) independentemente das representações do sujeito, permaneceria eternamente fora do alcance da ciência e do próprio sujeito.

Ao estabelecer tal tipo de Filosofia, Kant tentou aliar o racionalismo ao empirismo, pois ele mostrou que não haveria conhecimento sem percepção sensível e, tampouco, sem entendimento. Em termos kantianos, o filósofo estaria muito longe de ser aquele que sobre tudo indaga, como se julgava em tempos remotos.

Legitimamente, o filósofo investigaria as condições de possibilidade do conhecimento e também os fundamentos do dever moral. Ao fim e ao cabo, segundo Kant, as grandes questões filosóficas seriam apenas três:

  1. O que posso conhecer?
  2. O que devo fazer?
  3. O que posso esperar?

Antes de Kant, pensava-se que o sujeito movia-se em torno das coisas do mundo, mas ele propôs uma inversão: o sujeito seria o centro do conhecimento e também da ordem moral. Tal é a famosa “revolução copernicana” na filosofia, nas palavras o filósofo. 

Não existiria qualquer tipo de ciência de Deus ou da alma. Nos termos de Kant, as únicas metafísicas legítimas seriam as investigações sobre as condições de possibilidade do conhecimento e as indagações sobre os fundamentos da moral.

Há muitas razões pelas quais Kant deva ser tomado como um grande nome na História da Filosofia. Dentre elas, destaca-se a sua reflexão sobre a identidade da própria Filosofia. Quase duzentos anos após o surgimento da primeira ciência particular, Kant repensa o saber filosófico, nega-lhe o papel de uma ciência mais ampla, voltada ao conhecimento dos objetos.

Os objetos seriam conhecidos pela ciência, enquanto a Filosofia teria caráter transcendental (compreender o que posso e o que não posso saber). Frente à Ciência, a Filosofia passa a criticar o seu próprio auto-entendimento.

O pensamento de Kant divulgou-se rapidamente. Logo surgiram as críticas e questionamentos sobre alguns aspectos da sua filosofia, especificamente sobre a noção de coisa-em-si, como: se nós não temos acesso à coisa-em-si, por que falar sobre tal entidade? Se a coisa-em-si permanece eternamente inacessível, nós nada sabemos sobre ela, nem mesmo que ela nos é inacessível! Logo, a noção de coisa-em-si não deveria fazer parte do nosso discurso filosófico (esta ideia deu início ao Idealismo Alemão).

Porém, ao eliminarmos a coisa-em-si, permanecem apenas o homem e suas representações (os fenômenos) e o fato desconfortante de que a “verdadeira realidade” será algo, para nós, sempre desconhecido.

Sobre Immanuel Kant, é importante  que você leia também aqui netmundi:

  1. Conheça o imperativo categórico: nossos valores morais podem ser universais?
  2. A Crítica da Razão Pura: decifrando o título
  3. Resposta à pergunta: O que é esclarecimento?

Referências Bibliográficas

  1. HAMELYN, D. W. Uma história da filosofia ocidental. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1990.
  2. JERPHAGNON, Lucien. História das grandes filosofias. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
  3. NUNES, Benedito. A filosofia contemporânea: trajetos iniciais. São Paulo: Editora Ática, 1991.
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