FILOSOFIA

Resposta à pergunta: O que é esclarecimento?

Immanuel Kant: o que é esclarecimento?

Resposta à pergunta: O que é esclarecimento? é um texto de poucas folhas do filósofo prussiano Immanuel Kant (1724-1804). Contudo, apesar do pequeno texto, é considerado uma obra clássica da filosofia ocidental e do iluminismo.

O objetivo do filósofo nestas poucas páginas é discorrer sobre a situação de infantilidade intelectual dos homens e também sobre a melhor forma de promover o esclarecimento e o progresso  da humanidade. O seu título pode variar de acordo com a tradução, podendo também ser chamado de “Resposta à questão: o que é iluminismo?”.

Kant inicia o texto dizendo que a preguiça e a covardia são os únicos motivos que afastam os homens do esclarecimento e da autonomia. O estado de infantilidade intelectual é chamado de “estado de menoridade”, por vezes esta palavra também é traduzida como “minoridade”.

Não se trata, obviamente, da menoridade legal (menor de 18 anos no Brasil), mas da incapacidade do homem pensar e agir sem a ajuda de outras pessoas. O filósofo é claro: o esclarecimento é antes de tudo uma questão de coragem e ousadia.

Esclarecimento [<Aufklärung>] é a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a direção de outro indivíduo. O homem é o próprio culpado dessa menoridade se a causa dela não se encontra na falta de entendimento, mas na falta de decisão e coragem de servir-se de si mesmo sem a direção de outrem. Sapere aude! Tem coragem de fazer uso de teu próprio entendimento, tal é o lema do esclarecimento.

A preguiça e a covardia são as causas pelas quais uma tão grande parte dos homens continue de bom grado menores durante toda a vida. São também as causas que explicam por que é tão fácil que os outros se constituam em tutores deles. É tão cômodo ser menor.

Após esta introdução, o filósofo apresenta os responsáveis pelo estado de menoridade dos homens, que no texto são chamados de tutores.

O tutores ameaçam os homens alertando dos perigos de saírem dos caminhos que eles traçaram. Estes tutores podem ser líderes religiosos, professores, políticos, autoridades e outras lideranças.

Não por acaso, no final de sua carreira, com setenta anos e pouca saúde, Kant foi repreendido pelo rei prussiano Frederico Guilherme II para que não escrevesse mais, pois “fazia mau uso de sua filosofia e ofendia as Sagradas Escrituras e o Cristianismo”.  

Também foi duramente criticado por clérigos da igreja. Parece que o tempo deu razão ao filósofo, pois os tutores prontamente fizeram aquilo que Kant afirmou que eles faziam. É melhor para os tutores que os homens não sejam esclarecidos, conforme escreveu o filósofo:

Depois de terem embrutecido seu gado e preservado cuidadosamente estas tranquilas criaturas a fim de não ousarem dar um passo fora do caminho, mostram-lhes, em seguida, o perigo que as ameaça se tentarem andar sozinhas. Ora, este perigo na verdade não é tão grande, pois aprenderiam muito bem a andar finalmente, depois de algumas quedas. Basta um exemplo deste tipo para tornar tímido o indivíduo e atemorizá-lo em geral para não fazer outras tentativas no futuro.

Para que os homens se esclareçam, a liberdade é uma condição necessária.  Se um homem versado em um determinado assunto acredita que pode contribuir com algo que ele percebe de errado naquilo que conhece bem, então ele deverá fazer uso público da razão, apresentando seus argumentos e suas objeções, orientando e corrigindo outras pessoas.

Então, a liberdade para poder se expressar publicamente (seja através de livros, textos ou outros meios) é fundamental para o esclarecimento da humanidade.

Para este esclarecimento, porém, nada mais se exige senão LIBERDADE. E a mais inofensiva entre tudo aquilo que se possa chamar liberdade, a saber: a de fazer um uso público de sua razão em todas as questões. Ouço, agora, porém, exclamar de todos os lados: não raciocineis!

Que limitação, porém, impede o esclarecimento? Qual não o impede, e até mesmo favorece? Respondo: o uso público de sua razão deve ser sempre livre e só ele pode realizar o esclarecimento entre os homens.

Porém, o tranquilo filósofo prussiano não é um revolucionário e muito menos prega a desobediência. Immanuel Kant acredita que apenas o uso da razão promove o esclarecimento e consequentemente o progresso lento porém sólido da humanidade.

Kant tinha ainda ressalvas quanto aos jovens em outros textos, que para ele, devido à pouca experiência de vida, mal poderiam compreender bem a filosofia, muito menos poderiam ser esclarecidos.

O bom senso é uma marca deste filósofo, que nas passagens abaixo dá exemplos de obediência em nome da ordem e boa convivência em sociedade. Contudo, ao não concordar com alguma coisa, o homem sábio deve fazer uso público da razão e com isso contribuir para corrigir aquilo que percebe como errado.

Seria muito prejudicial se um oficial, a que seu superior deu uma ordem, quisesse pôr-se a raciocinar em voz alta no serviço a respeito da conveniência ou da utilidade dessa ordem. Deve obedecer. Mas, razoavelmente, não se lhe pode impedir, enquanto homem versado no assunto, fazer observações sobre os erros no serviço militar, e expor essas observações ao seu público, para que as julgue.

Do mesmo modo também o sacerdote está obrigado a fazer seu sermão à comunidade, de conformidade com o credo da Igreja a que serve, pois foi admitido com esta condição. Mas, enquanto sábio, tem completa liberdade, e até mesmo o dever, de dar conhecimento ao público de todas as suas ideias, cuidadosamente examinadas e bem intencionadas, sobre o que há de errôneo naquele credo. Pois o fato de os tutores do povo (nas coisas espirituais) deverem ser eles próprios menores constitui um absurdo que dá em resultado a perpetuação dos absurdos.

Apesar de suas ressalvas quanto aos líderes espirituais, o filósofo reconhece que este é um assunto de grande complexidade e acredita que falta muito para que os homens, nesse assunto, caminhem por si só.

Talvez Kant tenha escrito isso já prevendo reações políticas e religiosas. Esta observação, entretanto, não o livrou de censuras.

Falta ainda muito para que os homens, nas condições atuais, tomados em conjunto, estejam já numa situação na qual em matéria religiosa sejam capazes de fazer uso seguro e bom de seu próprio entendimento sem serem dirigidos por outrem.

Para o filósofo, não vivemos uma época esclarecida (apesar do otimismo iluminista). Pra ele, vivemos em uma época de esclarecimento. 

Se for feita então a pergunta: “vivemos agora uma época esclarecida”? A resposta será: “não, vivemos em uma época de esclarecimento”.

Baixe aqui o PDF: Resposta à pergunta: O que é esclarecimento.

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AutorAlfredo Carneiro – Graduado em Filosofia e pós-graduado em Filosofia e Existência pela Universidade Católica de Brasília.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

  1. KANT, Immanuel. Resposta à pergunta: o que é esclarecimento.
  2. DURANT, Will. A filosofia de Immanuel Kant. Ediouro.

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